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NA SICÍLIA, JUDEUS AJUDAM DESCENDENTES DE CONVERSOS DA ÉPOCA DA INQUISIÇÃO

 

Segue artigo publicado no JTA – The Global News Service of the Jewish People em 12 de setembro e reproduzido no WJC - World Jewish Congress. 

NA SICÍLIA, JUDEUS AJUDAM DESCENDENTES DE CONVERSOS DA ÉPOCA DA INQUISIÇÃO

                                                                                                                  Alex Weisler

Em seu leito de morte, a avó de Salvatore Zurzolo revelou um antigo segredo: sua família era judia.

Zurzolo, natural da Calábria, no sul da Itália, há muito tempo se inclinava para o judaísmo, desde quando, aos dezoito anos, numa viagem de jovens católicos a Paris, preferiu ficar com uma família judia.

Após a confissão de sua avó, Zurzolo entrou em contato com a comunidade judaica italiana em Roma e pediu para iniciar o processo de conversão. 

Zurzolo declarou que durante vinte anos lhe disseram que isto não era possível. 

Mas ele não desistiu, passando a consumir comida kasher, usando kipá e uma corrente com a estrela de Davi e visitando Israel dez vezes em duas décadas, de acordo com o seu relato. 

Finalmente, no mês de dezembro passado, ele fez a conversão formal para o judaísmo com um mergulho na antiga mikva de Siracusa, a quarta maior cidade da Sicília e um dos municípios mais meridionais da Itália. 

Na semana passada Zurzolo voltou para o local do banho ritual que fica no subsolo de um hotel, para uma conferência, a primeira do seu gênero, destinada aos “Ebrei di Ritorno”, o termo italiano para Judeus do Retorno – descendentes de judeus que foram forçados a converterem-se durante a época da Inquisição e que agora encaram a possibilidade de voltar a sua antiga religião. 

O encontro, que reuniu vários proeminentes rabinos italianos e mais de uma dezena de descendentes de judeus sicilianos, foi um acontecimento importante para Siracusa: ele assinalou a primeira vez em que a União das Comunidades Judaicas da Itália, UCEI, ofereceu reconhecimento e apoio. Entre os presentes estavam Elyahu Birnbaum, rabino-chefe de Turim; Shalom Bahbout, rabino-chefe de Nápoles e Roberto Della Rocca, chefe do Departamento de Educação e Cultura da UCEI. 

A Sicília tem agora seu primeiro rabino em quinhentos anos e a pequena sinagoga de Siracusa, que ocupa uma sala no andar térreo de um prédio de apartamentos num subúrbio da cidade, conseguiu atrair cerca de quarenta pessoas interessadas, é uma entre apenas duas ou três de comunidades judaicas da Itália ao sul de Nápoles. 

O mais importante é que a comunidade judaica italiana parece aberta para receber os judeus recém convertidos de Siracusa. O rabino Gadi Piperno, diretor do Departamento de Educação e Cultura da região sul da União das Comunidades Judaicas da Itália, veio a Siracusa para o recente evento. 

“Nós costumávamos dizer que Nápoles era a fronteira do judaísmo italiano. Mas agora, no extremo sul da Itália temos uma comunidade – assim, esta é a nova fronteira”, declarou ele. 

No encontro de dois dias os participantes contaram histórias pessoais de descoberta da sua descendência, citaram passagens da Tora – inclusive do Livro de Ruth, que trata da conversão da nora de Naomi – e ouviram Michael Freund, fundador e diretor da Fundação Shavei Israel, que procura facilitar as conexões entre descendentes de judeus, Israel e o povo judeu.

Freund, cujo grupo tem trabalhado com descendentes de judeus na Índia, na América do Sul, na Polônia e na Península Ibérica, disse que o encontro de Siracusa foi a sua primeira experiência com as assim chamadas comunidades anusim da Itália – descendentes dos judeus forçados a converterem-se. 

A Sicília tinha uma população judaica de pelo menos cinqüenta mil judeus na época da Inquisição e Freund acredita que receber os descendentes de judeus é a melhor maneira de vingar a violência e a intimidação daquela época. 

“A doce vingança para o que a Inquisição fez com os ancestrais daquela gente seria receber o maior número possível de pessoas”, disse ele. 

Os participantes disseram que não tinham encontrado o caminho para o judaísmo pelo estudo de suas árvores genealógicas. As narrativas individuais eram variadas, mas a essência era a mesma: havia um sentimento íntimo, uma verdade inescapável – com ou sem uma evidência em seu apoio. 

Elisabeta Barbera veio de Roma para assistir à conferência. Ela disse que suspeitava que sua família tivesse raízes judaicas e que a prova definitiva não é essencial. 

“Aos sessenta anos de idade, tenho o direito de morrer como judia. É isto que importa, é o meu sentimento, a minha fé”, disse ela.

Os presentes declararam que o evento os fez sentirem-se menos sós. 

Maria La Cara viajou de Palermo, capital da Sicília, cerca de três horas de viagem. Criada como católica, ela começou a freqüentar serviços religiosos pentecostais aos dezoito anos e sentiu-se atraída pela palavra Israel sempre que a ouvia nas orações.

 La Cara disse que um dos sobrenomes da sua família, Scimonetto, é um nome comum de conversos na região de Régio Calábria, no sul da Itália, mas ela não tem prova definitiva da sua ascendência judaica. 

“Acho que eu me sentiria melhor se tivesse provas de que sou judia. Se o meu passado se tornar mais claro, o meu presente também o será”, declarou.

La Cara disse ter recebido apoio da sua família, mas esta não é uma experiência comum na Sicília predominantemente católica. 

Carlo, um estudante de bioquímica de Catania, a cerca de quarenta minutos ao norte de Siracusa, não quis dizer seu sobrenome por causa de sua família que não aprova seu crescente envolvimento com o judaísmo. 

Quando tinha oito ou nove anos, Carlo sonhou que sua mãe e sua avó lhe disseram que ele era judeu, ele tem raízes judaicas nos dois lados da família, mas quando Carlo começou a se interessar pela religião na adolescência isto abalou sua família. 

“Minha família é uma família tipicamente siciliana – é católica. Para eles esta não é uma boa decisão. Ainda não decidi se vou completar o meu caminho para o judaísmo”, disse ele. 

Entre todas as questões existenciais e a retórica geral havia preocupações práticas. Esta era a principal preocupação do rabino Stefano di Mauro, um siciliano que se converteu ao judaísmo quando tinha trinta anos e depois descobriu as raízes judaicas da sua família.

Agora que Siracusa tem novamente uma sinagoga ele está concentrado na tarefa de tornar a cidade um lugar acolhedor para a comunidade de anusim. 

“O próximo passo é criar um beit din (tribunal religioso) permanente para o sul e facilitar a vida daqueles que querem voltar o judaísmo. Já não sou mais tão jovem para ficar entusiasmado, mas parece que Deus quis que isto acontecesse. Tantas coisas estão acontecendo ao mesmo tempo”, declarou ele. 

O próximo evento será um Shabaton, um retiro de final de semana na Calábria, na ponta da bota italiana. Mais adiante, em dezembro, a União das Comunidades Judaicas da Itália planeja realizar um grande evento em Nápoles, focado na ética e na política e que servirá também para atualizar a comunidade judaica italiana sobre o progresso da iniciativa de ajuda no sul.

Beatrice Macca, uma jovem estudante de farmácia que descobriu suas raízes judaicas há cerca de um ano e desde então aderiu à comida kasher e tem freqüentado a sinagoga, disse que o apoio da comunidade judaica italiana é muito importante. 

“O fato de o rabino Piperno ter vindo de Roma mostra que estamos nos tornando mais fortes”, disse ela. “Antes estávamos sós; agora tenho a esperança de mudar a cultura predominante na Sicília. 

                                                                                                        Tradução: Adelina Naiditch

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