JUDAISMO HUMANISTA

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Cientistas israelenses anunciaram recentemente a germinação de sementes de tâmaras datadas de dois mil anos atrás. O surpreendente resultado de suas pesquisas foi publicado em um artigo na renomada revista científica internacional Science, em fevereiro deste ano, despertando o interesse de estudiosos no mundo inteiro.

Edição 109 - Dezembro de 2020

Robin Allaby, geneticista da Universidade de Warwick, na Inglaterra, afirmou que esse surpreendente resultado “torna claro o fato de que nós ainda não conseguimos compreender a viabilidade, a longo prazo, das sementes”.

Essa história começou, no entanto, há mais de 30 anos, durante escavações realizadas na Fortaleza de Massada e nas cavernas de Qumran, no Deserto da Judeia, pelo arqueólogo Ehud Netzer, da Universidade Hebraica de Jerusalém. Netzer encontrou um pote cheio de sementes de tâmara, em bom estado de conservação, e os guardou por anos por considerar impossível voltarem a germinar após dois milênios. Em 2004, através de contatos acadêmicos, as sementes chegaram às mãos da equipe do Instituto Aravá de Estudos Ambientais, liderada pela doutora Elaine Solowey.

O Instituto está localizado no Kibutz Ketura, no extremo sul de Israel, próximo à cidade de Eilat. O estudo assume relevância, pois ajuda a conhecer como os agricultores do passado cultivavam o fruto, na região, e como puderam sobreviver milênios. “A germinação da espécie Phoenix Dactylifera representa uma oportunidade única para estudar as tamareiras da região, descritas na Antiguidade por sua qualidade e tamanho, bem como pelas propriedades medicinais de seus frutos – mas foram consideradas perdidas durante séculos”, afirma o artigo sobre o assunto na revista.

As primeiras análises genéticas revelaram que os agricultores do passado cultivavam tâmaras com traços de vários locais ao redor da Judeia. Segundo escritores clássicos como Galen, Strabo e Heródoto, havia uma fruta grande, doce, de longa conservação, que era muito cobiçada em todo o mundo romano. Depois do colapso do Império Romano do Oriente – precursor do Império Bizantino – e da conquista árabe da região, a produção de tâmaras decaiu na Terra de Israel. Na época das Cruzadas, ao redor do ano 1000 da Era Comum, as plantações das lindas tamareiras já não existiam.

No artigo, de fevereiro, o coautor do estudo, Fredérique Aberlenc, biólogo do Instituto Francês de Desenvolvimento Sustentável, explicava que a pesquisa pretendia polinizar plantas fêmeas, com a expectativa de poderem dar frutos – o que de fato ocorreu em setembro deste ano, quando o Instituto anunciou o crescimento das primeiras tâmaras na palmeira, denominada Hannah.

A ideia é produzir tâmaras com características que possam ser usadas para melhorar as variedades atuais, aumentando sua doçura, tamanho e resistência às pestes modernas, por exemplo. “À medida que novas informações são encontradas sobre características específicas associadas aos genes (por exemplo, cor e textura da fruta), esperamos reconstruir os fenótipos dessa tamareira histórica, identificando regiões genômicas associadas a pressões de seleção na história evolutiva”, ressaltou Aberlenc.

As plantas poderão, também, trazer informações sobre como se protegeram e conseguiram preservar seu DNA ao longo dos séculos. Embora algumas sementes antigas tenham sido germinadas com sucesso depois de centenas de anos congeladas na Sibéria, as tâmaras de Israel são algumas das plantas mais antigas cuja germinação deu certo. Isso porque o DNA e o RNA geralmente se dividem em partes muito pequenas que são suficientes para a análise de DNA antigo, mas não para fazer crescer e viver uma tamareira.

“Para que estas sementes germinem, o DNA tem que estar intacto, o que vai contra o que se sabe sobre preservação de DNA. Não é impossível que, de fato, haja algum tipo de sistema biológico de resfriamento que tenha sido responsável pela conservação do DNA nas tâmaras”, disse Nathan Wales, arqueólogo e geneticista da Universidade de York, também na Inglaterra.

Para Sara Sallon, da equipe israelense, as condições singulares ao redor do Mar Morto provavelmente influíram na preservação das sementes. “Baixa altitude, calor, clima seco – todos estes elementos podem ter afetado sua longevidade. O tamanho incomum também pode ter tido algum impacto, pois quanto mais material genético disponível, maior a chance de permanecer inteiro. A capacidade das sementes de permanecerem viáveis por longos períodos é importante na preservação dos recursos genéticos da planta”, explicou.

O início

A equipe do Instituto Aravá recebeu um reforço no ano 2000, com a chegada de Sara Sallon, gastroenterologista do Centro Médico e Universidade Hadassah, em Jerusalém, onde atuava desde 1983, antes mesmo de que se iniciassem as pesquisas com as sementes milenares de tâmara. Ela veio atraída pelos trabalhos desenvolvidos pela instituição na área de plantas e dessa fruta, em particular. Em 1985, a cientista fundou o Centro de Pesquisa em Medicina Natural Louis L. Borick, no Hospital, coordenando-o até 2000. Nos últimos 15 anos, ela se dedicou totalmente a estudar a aplicação de plantas na medicina. “Sempre tive muito interesse em plantas antigas, em saber como e onde cresceram e as consequências sofridas em decorrência da mudança climática, da poluição e do desenvolvimento. Sabia que o Instituto Aravá seria o local certo para dar continuidade a meu trabalho”.

As doutoras Solowey e Sallon tiveram acesso às sementes através do professor Joseph Patrich, do Instituto de Arqueologia da Universidade Hebraica de Jerusalém. “Passei horas e horas no Departamento de Arqueologia escolhendo as melhores sementes. Muitas tinham furos onde os insetos haviam bicado ou se desfizeram, mas algumas estavam realmente intactas”, explicou Sarah.

As primeiras sementes foram plantadas em estufas em 2005 e a árvore que germinou recebeu o nome de Matusalém, em referência ao mais longevo personagem bíblico. Segundo Miriam May, CEO dos Amigos do Instituto Aravá, o desenvolvimento das palmeiras representa uma inesperada história de sucesso.

Os primeiros resultados sobre as pesquisas com as sementes antigas foram divulgados em 2008, com o crescimento da Matusalém. Após 15 meses, a árvore foi transferida para um vaso maior e foram recolhidos das raízes vestígios da semente para realizar o processo de datação radioativa por carbono, que comprovou as suspeitas dos cientistas de que as sementes teriam perto de 2.000 anos!

No total das 32 sementes cultivadas no Aravá, seis brotaram com sucesso (quatro machos e duas fêmeas), em intervalos que variaram entre semanas e meses, sendo assim nomeadas: Adão, Jonas, Uriel, Boaz, Judith e Hannah. As análises com carbono demonstraram que os grãos datam de épocas diferentes, que variaram do século 1 antes da Era Comum ao século 4. O estudo das sementes indicou, também, que são 30% maiores do que as cultivadas atualmente em Israel.

Processo minucioso

Antes de serem plantadas em estufas as sementes passaram por um processo de aquecimento e hidratação gradativa, durante 24 horas, sendo tratadas com hormônios e fertilizantes naturais, dando origem, então, a tamareiras saudáveis. No início de 2019 Adão, Jonas e Hannah foram transferidos para o Parque de Pesquisa e Visitantes “Daniel Fischel & Sylvia Neil”, do Instituto Aravá, onde já estava Matusalém. Adão agora com 1,5m de altura e já produz flores, como Jonas. Matusalém, o primeiro a ser plantado, está com 3,5m de altura e é muito diferente das tamareiras atuais.

“Foi realmente impressionante fazer estas árvores reviverem – elas estavam simplesmente dormindo. Vê-las crescer e dar frutos foi um raio de luz em uma época como a atual, na qual as pessoas estão preocupadas e deprimidas com a pandemia. É um sinal da maravilhosa resiliência da natureza diante desta terrível destruição das espécies. A natureza jamais se renderá sem luta. Estes resultados nos incentivam a continuar com as pesquisas”.

Para darem frutos, as palmeiras fêmeas precisam do pólen produzido pela árvore macho. Assim, há alguns meses Hannah foi polinizada por Matusalém e em setembro surgiram as primeiras tâmaras. Quando perguntada sobre o sabor das tâmaras de Hannah, Sarah respondeu: “Maravilhoso! Particularmente acho a espécie Medjoul muito úmida e adocicada. As tâmaras dadas pela árvore Hannah são mais tenras e secas, com um sabor de mel no final que me remonta à ‘terra do leite e do mel’”. Os especialistas do Kibutz Keturah dizem que o sabor das tâmaras de Hannah se assemelha ao das provenientes da espécie iraquiana Zahidi. O que faz sentido, pois Hannah está geneticamente relacionada às tamareiras que cresciam na Babilônia, atual Iraque. Matusalém e Adão, cujas sementes foram encontradas em Massada, são muito semelhantes às arábicas e têm mais de dois mil anos. Hannah é mais “iraquiana”. “Presumimos que tenha sido trazida pelos judeus que retornaram do exílio, após a destruição do Primeiro Templo, porque o Talmud nos diz que eles trabalharam nas plantações de tâmaras durante o cativeiro. Já as sementes de Uriel, Boaz e Jonas datam do ano 200 desta nossa Era e foram encontradas nas cavernas em Qumran, onde os judeus se refugiaram para fugir das perseguições. Dão frutos mais semelhantes às tâmaras ocidentais, como as do Norte da África”, explicam.

A próxima etapa do projeto será reintroduzir as tamareiras da Judeia na agricultura moderna. Sarah Sallon acredita que é possível que tenham maiores propriedades medicinais e nutricionais do que as cultivadas atualmente. “Na Antiguidade as tâmaras eram também uma importante fonte de renda.

Seria muito bom trazer de volta da extinção esta variedade antiga, que está produzindo tâmaras muito boas, e reintroduzi-las no mercado”. A pesquisadora espera, também, arrecadar recursos para publicar o livro infantil que escreveu, cuja narrativa parte da visão do próprio Matusalém indo dormir em Massada e acordando em um moderno laboratório, dois mil anos depois.

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