JUDAISMO HUMANISTA

O Judaismo Humanista é a pratica da liberdade e dignidade humana

Bilhões de pessoas acompanharão a Copa do Mundo que se inicia hoje no Brasil. A maioria das pessoas sabe para qual time torcer: lealdades nacionais ou regionais; times com supercraques, como a Argentina de Messi, Portugal de Cristiano Ronaldo ou o Brasil de Neymar; times com estilo, como a Espanha, ou raça, como o Uruguai. E há também os indecisos, que preferem ficar sentados em cima do muro durante a primeira fase, até escolherem seus favoritos.

Se você é um indeciso judeu, entretanto, está “muito focado em tragédias passadas”, como afirmou o Rabino Abraham Skorka, o favorito do Papa Fracisco, por ocasião da visita do pontífice à Terra Santa. Desta maneira, você não tem escolha: deve levar em conta o passado vivido pelos judeus em cada um dos países, assim como sua atual relação com o Estado de Israel. Nenhum judeu pode ignorar o “fator lamentação”, exercido desde que nos sentamos às margem dos rios da Babilônia e choramos todas as nossas mágoas.

É para isto que existe este guia. O guia mais etnocêntrico, provinciano, cabeça-fechada e de olho apenas no próprio umbigo disponível sobre a Copa do Mundo. Para começar, não dividiremos os países por grupos, como no torneio propriamente dito, mas faremos eliminações em massa a cada fase, de acordo com nossa análise subjetiva do histórico de cada país com o judeus. No lugar do Ranking da FIFA, usaremos o “Índice de Antissemitismo”, apurado em recente pesquisa mundial realizada pela ONG americana Anti-Defamation League.

Este guia foi adaptado do original escrito por Chemi Shalev, no jornal israelense HaAretz (em inglês e hebraico), e obviamente não deve ser levado a sério.

Primeira faseeliminados diretamente com um cartão vermelho

Estes são os times excluídos do jogo devido a transgressões passadas ou hostilidades presentes:

Argélia (87% de antissemitismo, segundo o índice da ADL): Por incitação ao antissemitismo, por erradicar sua vibrante comunidade judaica e apesar de suas grandes contribuições à humanidade através dos filósofos Jacques Derrida e Bernard-Henry Levi e, claro, de Zinedine Zidane, o maior jogador que eu vi jogar.

Argentina (ADL: 24%): Ainda que seja o lar de 200 mil judíos, foi um porto seguro para fugitivos nazistas (vide X-Men: First Class), berço de excêntricas teorias conspiratórias sobre o controle judaico sobre o mundo e de generais antissemitas assassinos. Além, é claro, de sede dos sangrentos, e até hoje não-solucionados, atentados da década de 1990.

Croácia (ADL: 33%): Pelo regime pró-nazista à época do Holocausto, além da típica saudação usada pelo zagueiro Josip Simunic no jogo contra a Islândia, em dezembro de 2013, que lhe rendeu uma suspensão.

Alemanha (ADL: 27%): Sim, 70 anos se passaram, e sim, eles nos vendem submarinos, e sim, jogam excelente futebol, mas não, ainda não superamos. Vamos rediscutir o assunto pra Copa de 2034.

Grécia (ADL: 69%): O país não-muçulmano mais antissemita do mundo, de acordo com a ADL, onde o neo-nazismo passa por uma Aurora Dourada. Apesar do caso de amor instantâneo que resultou da crise entre Israel e a Turquia, seus inimigos mortais, nos lembramos dos macabeus e das calorias punitivas contidas nas levivot e nas sufganiot.

O meio-capista Giorgos Katidis foi banido da seleção grega por fazer a saudação nazista em 2013.

O meio-campista Giorgos Katidis foi banido da seleção grega por fazer a saudação nazista em 2013.

Irã (ADL: 20%): Decisão fácil, apesar do presidente Rouhani, da cantora Rita e de nos ter permitido construir o Segundo Templo, há 2500 anos. Se as negociações acerca de seu programa nuclear alcançarem bons resultados, talvez possamos reconsiderar para 2018.

Itália (ADL: 20%): O destino turístico preferido dos israelenses, com a melhor comida e o povo mais agradável, ainda está manchado por ter formado o Eixo com a Alemanha, inventado o gueto e por ter destruído o acima-mencionado Segundo Templo.

Suíça (ADL: 26%): Por ter fechado as portas para os refugiados judeus na Segunda Guerra Mundial e lucrado bilhões com seus bens confiscados. No século XVIII, os suíços confinaram os judeus a apenas duas vilas – Lengnau e Oberendingen – e rebelaram-se quando Napoleão tentou libertá-los. Uma prévia do que estava por vir.

Segunda fasecartão amarelo

Restaram 24 times e, nesta rodada, eliminaremos os países que têm um histórico misto para com os judeus ou Israel, ou aqueles não fizeram algo tão grave, mas também não se esforçaram para serem simpáticos:

Camarões (ADL 35%): Pode até passar para a próxima fase se o rabino Israel Oriel, também conhecido como Bodol Ngimbus-Ngimbus (sério, um link não seria suficiente, procurem essa história no Google) conseguir provar que realmente é um levi, descendente de Moisés, ou que Ba-Saa, o nome de sua tribo, realmente significa “em jornada”, em hebraico.

Chile (ADL: 37%): A casa de 20 mil judeus, muitos dos quais se deram bem sob o governo socialista de Salvador Allende e, infelizmente, também sob a ditadura de Augusto Pinochet. Abrigou fugitivos nazistas e recusou-se a extraditá-los para serem julgados na Alemanha.

Colômbia (ADL: 41%): Péssima colocação no índice de antissemitismo, conhecida pelos obscuros acordos de compra de armas israelenses, além de violência e instabilidade que acabaram levando a maioria de seus 12 mil judeus a Miami.

Equador (ADL: sem nota): Praticamente sem judeus, mas um presidente, Rafael Correa, que lidera as agitações anti-Israel, inspiradas em seu vizinho e modelo, Hugo Chavez.

França (ADL: 37%): Berço de Rashi, grande gênio judeu, de Leon Blum e da primeira emancipação dos judeus, em 1791. Compensado por uma longa história de inquisições, cruzadas, pelo Caso Dreyfus, pelo Governo de Vichy, pelas incitações anti-Israel de Charles de Gaulle, pelo crescente antissemitismo, pela incômoda política externa e, finalmente, pela infame quenelle, o gesto repetido pelo atacante Nicolas Anelka.

A quenelle de Nicolas Anelka.

A quenelle de Nicolas Anelka.

Gana (ADL: 15%): Além de servir de casa para a renascida tribo Casa de Israel em Sefwi-Wiawso, foi o projeto-piloto e principal beneficiado pela “relação especial” de Israel com a África, na década de 1960, que logo se dissipou.

Honduras (ADL: sem nota): Por ter conseguido incluir os judeus e o sionismo em uma teoria conspiratória à época do golpe que depôs o presidente Manuel Zelaya, em 2009.

Costa do Marfim (ADL: sem nota): Seu lendário presidente Feliz Houphouet-Boigny queria fazer a paz entre Israel e os árabes, e foi tão bem-sucedido quanto John Kerry.

Japão (ADL: 20%): Nunca foi muito ruim para os judeus, e até os ajudou a escapar dos nazistas, mas foi culpado por sua cumplicidade no crime. E também por seu mórbido interesse no best-seller “Os Protocolos dos Sábios de Sião”.

Coréia do Sul (ADL: 53%): Grande amiga de Israel, mas o índice de antissemitismo foi decisivo, ainda que se possa afirmar que sua análise sobre a influência e o poder dos judeus se baseie em temor, não em suspeita. Não soubemos como lidar com a obrigatoriedade do estudo do Talmud nas escolas coreanas.

México (ADL: 24%): Recebe judeus desde a Inquisição, no século XVI. Absteve-se na votação do Plano de Partilha da Palestina pelas Nações Unidas, em 1947, mas é um grande amigo de Israel hoje em dia, tendo calorosamente recebido Shimon Peres no ano passado.

Nigéria (ADL: 16%): Milhões de seus cidadãos alegam serem descendentes das Dez Tribos Perdidas. Cortou relações com Israel após a Guerra do Yom Kipur, mas já fez as pazes.

Rússia (ADL: 16%): A nave-mãe da existência judaica no século XX, brilhantemente apelidado pelo historiador Yuri Slezkine como “o século judaico”. Fonte de antissionismo e de antissemitismo oficial por muitas décadas e de um perturbador proto-fascismo atualmente.

Espanha (ADL: 29%): Berço da Idade de Ouro, nos brindou com gênios como Maimônides, ibn Ezra, Iniesta e Xavi – ainda que não se possa provar o judaísmo dos dois últimos. Manchada pela Inquisição, pela expulsão e pelo Generalíssimo Franco. Tenta redimir-se, entretanto, ao oferecer cidadania automática aos descendentes dos que foram expulsos pelo Decreto de Alhambra, em 1492.

Uruguay (ADL: 33%): Em 1726, vetou a entrada de pessoas que fossem “inferiores, como mouros e judeus”, mas serviu de porto seguro para muitos durante o Holocausto. Votou por um lar nacional judaico na Conferência de San Remo, em 1920, e foi o primeiro país latino-americano a reconhecer o Estado de Israel.

Terceira rodada – os que passaram de fase

Bélgica (ADL: 27%): Resistiu à ocupação alemã e salvou grande número de judeus, proporcionalmente. Sedia a última grande comunidade ultra-ortodoxa européia, na Antuérpia. Mas liderou a campanha para condenar israelenses por crimes de guerra e vivenciou o recente atentado terrorista contra o Museu Judaico de Bruxelas.

Costa Rica (ADL: 32%): Restringiu a entrada de judeus até a metade do século XIX, mas tem uma grande população de “judeus cristãos”. É uma boa amiga de Israel, além de receber milhares de turistas israelenses anualmente, inclusive os que se casam com moças costarriquenhas e ficam por lá.

Inglaterra (ADL: 8%): De Balfour e Churchill a Sacha Baron Cohen e Nigella Lawson, mas com o massacre de York, expulsões em massa, antissemitismo literário, vestimentas vexatórias para os judeus e as limitações do Mandato Britânico à imigração judaica quando nós mais precisávamos.

Países Baixos (ADL: 5%): Favoritos dos israelenses desde a década de 1970, berço do “Futebol Total” e do clube “judaico” Ajax, com excelente posição no ranking do antissemitismo e grande amigo de Israel. Mas precisou de uma campanha de relações-publicas para esconder a realidade: os governantes neerlandeses eram tragicamente eficientes para localizar judeus e entregá-los aos nazistas – Anne Frank, inclusive.

A torcida "judaica" do Ajax, de Amsterdã.

A torcida “judaica” do Ajax, de Amsterdã.

Portugal (ADL: 21%): Poderia ter sido eliminado mais cedo, junto com a Espanha, por ter inventado os temidos autos-da-fé. Mas expulsou os judeus com o coração partido no século XV, resistiu às leis nazistas durante a II Guerra Mundial e sofreu com o embargo de petróleo árabe, em 1973, por ter permitido que as aeronaves americanas realizassem paradas de abastecimento em seus aeroportos ao levarem armamentos de que Israel tanto precisava na Guerra do Yom Kipur.

Semifinais

Quatro times seguem na disputa. A competição está ferrenha. Após prorrogação e pênaltis, nos despedimos de mais dois países:

Bósnia e Herzegovina (ADL: 32%): A surpresa desta Copa do Mundo. O único território da Europa que acolheu os judeus expulsos da Espanha no século XV. Tem mais Justos Entre As Nações – cidadãos reconhecidos pelo Memorial Yad Vashem por terem ajudado a salvar judeus durante o Holocausto – do que as sempre lembradas Dinamarca e Bulgária. Preservou a histórica Hagadá de Sarajevo, datada do século XIV.

Austrália (ADL: 14%): Sob o comando do General Allenby, participaram da libertação de Beer Sheva, em 1917. Uma das mais ricas e vibrantes entre as comunidades judaicas do mundo, grande apoiadora de Israel – disputando com o Canadá a segunda colocação – apesar de ter recebido apenas judeus ashkenazim até a década de 1970, em função da política racista da Austrália Branca.

Final – os americanos bem que gostariam…

Estados Unidos (ADL: 9%): A Terra da Liberdade, sede da maior comunidade judaica na história da Diáspora, sustentáculo e âncora estratégica de Israel – ainda que os líderes israelenses nem sempre dêem o devido valor. O lugar, como George Washington prometera em 1790, onde “todo ser humano estará livre para sentar-se debaixo da sua videira e debaixo da sua figueira, e ninguém o incomodará nem ameaçará”.

versus

Brasil (ADL: 16%): Podemos ter forçado um pouco a barra. Chamaríamos de “la mano de diós”, mas os leitores brasileiros jamais nos perdoariam.

O Departamento de Estado americano classifica o antissemitismo no país como “muito raro”. Exerceu papel importante na fundação do Estado de Israel. Drones e empresas israelenses participam da segurança da Copa do Mundo. Até o Kaká, cujo nome é Ricardo Izecson, possivelmente tem ascendentes judeus.

E não nos esqueçamos que, se o Brasil não levantar a taça no próximo dia 13 de julho, no Estádio do Maracanã, não apenas muitos torcedores israelenses ficarão decepcionados, mas o luto tomará toda a população brasileira – incluindo, naturalmente, seus 100 mil judeus.

Então nos juntemos na torcida: Vamos, Brasil! O Hexa está chegando!

Imagem de capa: http://www.soccerbyives.net/images/2013/12/BrazucaAdidas2WorldCup20...

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