Um dos textos mais estudados e comentados da literatura talmúdica é, sem dúvida Pirkei Avot, ou Ética dos Pais, como é conhecido em Português. A explicação para tamanha popularidade talvez resida no fato de ser um texto extremamente simples e com conselhos práticos. Outro fator que pode explicar seu sucesso está no fato de ser uma obra incomum, pois apresenta sinteticamente os ensinamentos dos sábios de várias gerações. Seu texto pode ser encontrado num Sidur completo. Apesar de sua simplicidade, é um tratado que dá margem à diversificadas e profundas interpretações. A obra mais completa sobre Pirkei Avot em Português pode ser encontrada no livro A ética do Sinai, da editora Sêfer. Lá o autor Irving M. Bunim dá diversas interpretações de vários sábios judeus durante a história, além de introduzir seu próprio parecer.
"'Mesmo sendo este tratado pequeno e de fácil compreensão na superfície, agir de acordo com o seu conteúdo não é fácil para todos, nem suas intenções compreensíveis, sem uma explicação detalhada'."
O livro em estudo (Os oito capítulos, editora Maayanot) trata-se de uma introdução ao Pirkei Avot feita por Moshê Ben Maimon, mais conhecido como Maimônides ou RAMBAM no meio judaico. Com explicações sobre a alma, Maimônides ensina os pré-requisitos para cumprir os ensinamentos éticos do tratado, através da conduta moral. Segundo o próprio autor "mesmo sendo este tratado pequeno e de fácil compreensão na superfície, agir de acordo com o seu conteúdo não é fácil para todos, nem suas intenções compreensíveis, sem uma explicação detalhada. No entanto, leva à grande perfeição e à verdadeira felicidade". Esta introdução foi escrita por Maimônides em oito capítulos. Segundo o autor os ensinamentos contidos neles podem despertar o indivíduo a tomar uma nova postura de vida pautada na busca pelo Conhecimento Divino, que seria, ainda segundo o autor, o objetivo principal dos que se guiam pelos ensinamentos da Torá. Recomendamos a leitura de todos os oito capítulos, pois encerram em si séculos de uma profunda sabedoria.
Neste artigo nos limitaremos a apresentar uma resenha do quarto capítulo, onde há uma interessante discussão sobre a virtude e o vício. Entretanto, a leitura de todos os oito capítulos é de fundamental importância para o pleno entendimento das ideias do filósofo. Capítulo 4 Sobre o tratamento das doenças da alma Neste capítulo, Maimônides aborda a questão da alma de uma maneira mais prática. Como um médico, ensinará como é possível melhorar as ações, para que se possa livrar-se dos excessos e das faltas. Para tal, definirá quais são as virtudes da alma, introduzindo o conceito do equilíbrio. Bom é aquilo que se situa entre o exagero e a escassez. Esse equilíbrio vale para todas as ações. "A virtude pode ser definida como uma característica resultante do estado de equilíbrio da alma."
Assim, diz RAMBAM, são ruins todos os extremos: tanto o excesso quanto a deficiência. Dessa forma a virtude pode ser definida como uma característica resultante do estado de equilíbrio da alma. O primeiro exemplo dado por Maimônides refere-se à moderação. Esta é a virtude que se encontra entre os extremos da luxúria e da insensibilidade ao prazer. Esses dois extremos são, nos dizeres do sábio, "vícios morais". RAMBAM dá outros exemplos. Para melhor vizualizá-los utilizamos aqui uma tabela:
* "(...) a pessoa de bom coração é aquela que tem toda a intenção de fazer o bem para as pessoas (...) sem ferir ou envergonhar a si própria: este sim é o equilíbrio." (p.24) ** "O de coração muito bom é quem faz as coisas descritas acima, com bom coração, mesmo que o prejudique ou envergonhe ou tenha de fazer muito esforço e tenha grande prejuízo com isto, este é o outro extremo." (p.24) A origem dos vícios morais Maimônides diagnostica a forma como esses vícios morais enraizam-se na alma, e, como consequencia, manifestam-se na prática. Segundo ele, todos esses vícios são fruto de uma repetição de uma ação referente a um hábito, em um longo período de tempo.
"O meio familiar e social em que uma criança cresce faz com que ela se acostume às ações desse meio, que podem estar equilibradas, ou no excesso ou deficiência."
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