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Sefarditas — Os Judeus Esquecidos na Memória da Shoá

Na noite deste domingo, 5 de maio, até a noite de segunda-feira, 6 de maio de 2024, no calendário gregoriano, e em 27 de nissan, no calendário hebraico. Este dia é lembrado anualmente como “Yom HaShoá”, ou “Dia de Lembrança do Holocausto”

Por: Rafhael Trajano

Na noite deste domingo, 5 de maio, até a noite de segunda-feira, 6 de maio de 2024, no calendário gregoriano, e em 27 de nissan, no calendário hebraico. Este dia é lembrado anualmente como “Yom HaShoá” , ou “Dia de Lembrança do Holocausto”, sendo inclusive feriado nacional em Israel e também uma data incorporada nas comunidades judaicas espalhadas pelo mundo. Mas quando se pensa em vítimas do Holocausto normalmente vem à mente judeus que residiam na Alemanha, Itália, Polônia, Holanda, Rússia e Ucrânia, sendo os focos judeus ashkenazitas que formaram suas comunidades nesses países por meio de processos migratórios relacionados a pogroms e miscigenação. Contudo, tratando especificamente da população judaica vítima da Shoá, em aproximadamente 6 milhões de pessoas, é necessário um olhar mais amplo.

Ah, judeu sefardita? Que exótico!

Durante muito tempo passou desapercebida uma outra parte dessa população judaica, os judeus sefarditas que também foram vitimados no genocídio nazista. De acordo com o Dr. Nils Roemer, durante uma palestra sobre “Judeus Sefarditas e o Terceiro Reich” para a Society for Crypto-Judaic Studies, veja aqui: http://www.youtube.com/watch?v=mi-FiXemR9Q , é necessário interromper a exclusão da memória dos judeus na região dos Balcãs e no Norte da África, isso fica evidente não só no campo de estudos sobre o Holocausto mas nos memoriais e museus que focam nessa geografia que destaca alguns países da Europa, sendo que a Shoá não foi um evento exclusivamente europeu.

Devin Naar, descendente de judeus gregos e professor de Estudos Sefarditas na Universidade de Washington, narra sua própria experiência como descendente de vítimas da Shoá, quase não havia informações disponíveis sobre sua família e quando conversava sobre suas origens com amigos e colegas, diziam — “Oh, judeu sefardita? Que exótico! Havia judeus na Grécia? Eu não sabia disso. Eles foram afetados pelo Holocausto? Eu não faço ideia. Ladino, o que é isso?” veja aqui: http://www.youtube.com/watch?v=sGkmhkImDWo .

O Yiddish, uma língua que é resultante da fusão de hebraico, alemão e línguas eslavas, é parte da cultura ashkenazi e para POLLIN-GALAY, 2015, também é associada à memória da Shoá, mas o multiculturalismo linguístico judaico tem sido ignorado, é o que acontece com o ladino ou judeu-espanhol, língua resultante da fusão entre hebraico, castelhano, catalão, português e árabe, falada pelos sefarditas e não é reconhecida como uma língua de sobreviventes da Shoá. O mesmo ocorre com a Haquitia, dialeto derivado do ladino com influência do judeu-árabe e do tarifit, falado por judeus de origem marroquina.

O processo expansionista do Terceiro Reich ultrapassou as fronteiras do continente europeu.

É preciso ter em mente que o processo expansionista do Terceiro Reich ultrapassou as fronteiras do continente europeu, inclusive com uma expedição pela região amazônica conhecida como Expedição Jari no município de Laranjal do Jari no estado do Amapá, veja aqui: https://www. youtube.com/watch?v=mad-KBhE3Is , e assim o regime nazista foi chegando a outros lugares do globo terrestre. De acordo com o levantamento feito por Jewish Gen — The Global Home for Jewish Genealogy; Divisão de Pesquisa Genealógica do Museum of Jewish Hereditage A Living Memorial To The Holocaust, judeus sefaraditas foram deportados para o campo de concentração de Bergen — Belsen, localizado na Baixa Saxônica, sendo que em 1943, judeus de países considerados neutros como Espanha, Argentina, A Turquia foi deportada para esse lugar.

Neste levantamento dos dados incluem heróis que nasceram na Bulgária, França, Grã-Bretanha, Itália, Líbia, Holanda, Iugoslávia, Turquia e surpreendentemente Israel, onde 85.000 judeus foram deportados da França entre março de 1942 até agosto de 1944, dentre os quais 14 tinham documentos nascidos em França, 13 em Paris, 1 em Marselha e 2 tinham nomes encontrados no Norte da África, os outros tinham nomes da região dos Balcãs, localidades onde tinham comunidades sefarditas. No período que compreende os anos de 1911 até 1943, a Líbia foi uma colônia italiana e sua população judaica era de 30.000 pessoas até a 2ª Guerra Mundial, com o estreitamento das relações entre a Itália e a Alemanha nazista, as primeiras leis raciais foram aplicadas aos judeus líbios em 1938.

Também há outra tragédia que passa desapercebida na história do Holocausto, o Farhud.

Posteriormente, em 1941, os judeus da cidadania francesa foram deportados para a Tunísia, de acordo com Bluma Gordon, além da Tunísia e da Líbia foram estabelecidos campos de trabalho obrigatórios em Marrocos e na Argélia, enquanto 300 judeus britânicos foram deportados para campos temporários na Itália. Também há outra tragédia que passa desapercebida na história do Holocausto, o Farhud, um pogrom de inspiração nazista que ocorreu no Iraque onde a propaganda pró-nazi se alastrou pelo país através de uma tradução para o árabe do livro de Adolf Hitler intitulado “Mein Kempf ”E em maio de 1941, durante a festa de Shavuot, multidões que juraram fidelidade ao Mufti e a Hitler assassinaram 180 judeus e feriram ou mutilaram outros mais de 2.000, as vítimas desse pogrom não são reconhecidas como sobreviventes do Holocausto.

Enquanto que em maio de 1940 os alemães invadiram a Holanda, o censo realizado pelos nazistas apontava 121.000 ashkenazitas e 4.000 sefarditas e em 1942 teve início a deportação desses judeus, do campo de internação de Westerbork para vários campos de concentração — Auschwitz, Sobibor, Theresienstadt e Bergen-Belsen. Segundo informações trazidas pelo Dr. Nils Roemer, em sua palestra já citada anteriormente, alguns desses sefarditas conseguiram escapar de serem deportados por sua ascendência não ser precisamente verificável até os avós, consequência do processo inquisitório na Península Ibérica onde todas as suas colônias nas Américas, países africanos e asiáticos, além dos Países Baixos que pertenceram ao Império Espanhol, como é o caso da Holanda que recebeu muitos judeus espanhóis e portugueses fugidos da Inquisição Católica, ironicamente essa desconexão com antepassados salvou alguns desses judeus.

Porém, mesmo judeus nascidos em Eretz Israel — Terra de Israel, não conseguiram se salvar da máquina de extermínio nazista. Isso aconteceu devido ao colapso do Império Otomano no final da 1ª Guerra Mundial onde as famílias sefarditas que residiram no mesmo lugar durante 4 ou mais séculos, acabaram se mudando para França e Bélgica, outros para América Latina, durante essas viagens seja para visitar familiares, estudar ou para fins comerciais, alguns foram barrados pela polícia ou pela Gestapo com o início da guerra. Como relata o jornalista e romancista judeu amazonense Márcio Gonçalves Bentes de Souza que viajou para a Grécia e encontrou na lista de vítimas do Holocausto o sobrenome Bentes, veja aqui: http://www.youtube.com/watch?v=64fgrW9zPYg, um dos sobrenomes tradicionais de judeus sefarditas de origem marroquina que migraram para a região amazônica durante o ciclo da borracha no século XIX.

Henriette Asseo certa vez disse — “Meu povo não existe. Banido da memória nas portas dos campos.”

Os judeus sefarditas na Bósnia e na Croácia estiveram sob o governo de um estado satélite fascista-católico criado em abril de 1941 pela Alemanha, realizando perseguições semelhantes aos pogroms antes de juntá-los em campos de concentração locais onde foram assassinados junto com sérvios e ciganos. Além da comunidade sefardita na Bulgária que também foi oprimida por um aliado nazi que acabou cedendo à pressão de parlamentares, clérigos e intelectuais búlgaros para não os deportar e assim mais de 50.000 judeus sefarditas foram salvos.

Em um artigo publicado pelo Yad Vashem — The World Holocaust Remembrance Center, a autora Yael Weinstock Mashbaum explica que embora existissem comunidades sefarditas na França e na Holanda, a maioria estava nos países dos Balcãs, na Iugoslávia, Bulgária e Grécia, segundo o Museu Memorial do Holocausto dos EUA, as comunidades sefarditas da Sérvia e norte da Grécia, incluindo 50.000 judeus de Salônica, estiveram sob ocupação nazista em 1941, sofreram desapropriação, humilhação, trabalhos forçados, sequestro e finalmente a deportação para o campo de concentração em Aschwitz-Birkenau onde ocorreu a Solução Final, inclusive parte dos sefarditas de Salônica, de acordo com jewishvirtuallibrary.org, foram forçados ao trabalho degradante do Sonderkommando que consistia em tirar os corpos das câmaras de gás e dos fornos crematórios onde também houve resistência, mas ainda assim em 1943 os judeus sefarditas de Salônica que estavam no campo de concentração foram exterminados.

Uma mulher de ascendência Salônica chamada Henriette Asseo certa vez disse — “Meu povo não existe. Banido da memória nas portas dos campos.” Este artigo tem como objetivo mudar esta realidade, que neste Yom HaShoá esteja na nossa memória os 6 milhões de judeus vítimas do Holocausto, todos eles, ashkenazitas e também sefarditas que durante muito tempo não tiveram sua história contada, e também todas as outras vítimas das leis de Nuremberg e do genocídio nazista, sejam ciganos, LGBTQIA+, PCDs, opositores políticos, religiosos de outras confissões de fé, negros. Portanto, apesar de tudo continuamos aqui e o nosso lema continua de pé, especialmente após o dia 7 de outubro de 2023. Nunca mais!

Publicado originalmente em: https://medium.com/@agentesdazion/sefarditas-os-judeus-esquecidos-n...

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Comentário de ANTONIO RAIMUNDO DE MOURA NETO em 30 agosto 2024 às 18:59

Excelente abordagem!

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