JUDAISMO HUMANISTA

O Judaismo Humanista é a pratica da liberdade e dignidade humana

 

 Israel e Gaza: O conflito do absurdo
 
Formou-se na UFRJ e realizou doutorado sanduíche na Johns Hopkins University (EUA). Foi editora na American Association for the Advancement of Science, que publica a revista Science. Em 2007 voltou pro Brasil e criou a Publicase.
Várias linhas de pesquisa no campo da psicologia estudam como o ser humano se relaciona com suas opiniões e ideias. Sabe-se que há grande dificuldade em se sensibilizar o indivíduo em relação a opiniões alheias quando o tema no qual que se crê é algo que mora “tão perto da mente e do coração do indivíduo”. Um rápido passeio pelo Facebook pode ilustrar este comportamento.
Um exemplo de tal comportamento aparece na forma como as pessoas se posicionam em relação ao conflito entre Israel e Gaza. O posicionamento da maioria dos judeus israelenses preconiza ideias tais como “os palestinos são os responsáveis pela continuação do conflito”, “Israel é um país de paz e amor que só quer a paz”, ou ainda “os palestinos não estão comprometidos com a paz porque eles preferem a violência”. Atualmente, tais ideias compõem as bases da sociedade israelense (em sua maioria; claro que há exceções). De fato, Irene já escutou estas mesmas frases vindas da boca de Israelenses com posições assumidamente de centro ou de direita.
No caso do conflito entre Israel e Gaza, as barreiras sócio-psicológicas de ambos os lados contribuem fortemente para a continuação do conflito, que já dura quase 1 século. E já é mais que sabido que em casos assim, da contra-argumentação acaba surtindo o efeito bumerangue, onde o sujeito assume uma posição defensiva e se torna imune a qualquer argumento. No final, este tipo de abordagem acaba por fortalecer ainda mais as opiniões iniciais dos indivíduos.
No conflito entre Israel e Gaza, não tem lado certo e nem lado errado. Mas o que certamente tem é muita intolerância de ambos os lados. E como ter acesso a esta intolerância a ponto de sensibilizá-la de alguma forma? Esta foi a pergunta que The Fund for Reconciliation, Tolerance, and Peace, uma ONG americana, fez a um grupo de pesquisadores Israelenses da Universidade de Tel Aviv e Universidade Hebraica de Jerusalém.
A pedido da ONG americana, o grupo de pesquisadores investigou o desenvolvimento de uma intervenção psicológica que conseguisse de alguma forma sensibilizar um número de indivíduos da sociedade israelense e assim despertar nestes indivíduos um novo olhar sobre o conflito.
Depois de considerar várias opções, o grupo de pesquisadores chegou ao que eles chamaram de “The Conflit”, que é basicamente uma série de vídeos curtíssimos (menos de 1 minuto), onde ao invés de tentar persuadir os indivíduos de que o conflito é algo ruim para a sociedade israelense, o vídeo apresenta o conflito de forma positiva e explorando especialmente as ideias fundamentadas na sociedade israelense. Segundo os pesquisadores, esta campanha de seis vídeos constitui uma abordagem de pensamento paradoxal, onde cada um dos vídeos explora um dos fundamentos que mora no cerne da identidade israelense. Por exemplo, um dos vídeo explora a noção israelense de que o exército israelenses e os israelenses de modo geral sempre adotam uma postura moralmente correta em relação aos palestinos e aos árabes. No final do vídeo aparece a seguinte frase: precisamos do conflito para nos sentirmos moralmente corretos (in order to feel moral, we need the conflict). No outro vídeo são mostradas imagens do exército israelense em plena ação, com bombas e tanques e explosões. No final vem a frase “nós precisamos do conflito para termos o exército mais forte do mundo” (we need the conflict in order to have the strongest army in the world).
Um grupo de 161 judeus israelenses foram convidados para participar do estudo através de um recrutamento feito pela internet. O grupo de indivíduos recrutado foi então separado em dois, um grupo sofreria a intervenção e seria aquele que efetivamente assistiria os vídeos em momentos diferentes, com intervalos de 3 ou 4 semanas, e o outro grupo seria o controle, que assistiria vídeos curtos sobre turismo, na mesma quantidade e intervalos que o grupo testado. Para se analisar o resultado da intervenção, os dois grupos foram submetidos a questionários que exploravam três aspectos principais, após a intervenção: (1) se houve alguma demonstração de sensibilização dos indivíduos testados (chamado de unfreezing), (2) se houve alguma mudança quanto ao nível de responsabilidade conferido aos palestinos em relação a perpetuação do conflito, e se (3) houve alguma tendência para se fazer concessões (to compromise).
A análise dos resultados revelou que a intervenção de fato teve o poder de sensibilizar os indivíduos e mudar atitudes. Por exemplo, após a intervenção, muitos indivíduos no grupo submetido a intervenção se mostraram mais inclinados a apoiar a desocupação de assentamentos na Cisjordânia (West Bank), do que o grupo controle. Mais impressionante foram as revelações quanto as escolhas politicais do grupo. Quando entrevistados sobre como teriam votado, o grupo demonstrou ter optado por candidatos mais inclinados ao diálogo, e com politicas mais conciliatórias, do que outros candidatos. Estas escolhas foram significativamente diferentes daquelas feitas anteriormente a intervenção neste grupo de indivíduos e também foram diferentes das escolhas feitas pelo grupo controle, que permaneceu sem alterações. Este achado indica que houve um relaxamento em relação as opiniões prévias dos indivíduos submetidos a intervenção. Mas importante ainda é perceber que o impacto da intervenção não foi algo somente momentâneo, já que seu efeito pôde ser sentido até mesmo um ano após a conclusão do estudo, quando ocorreram as eleições em Israel em 2013.
O grupo de pesquisadores acredita que a apresentação dos vídeos contendo narrativas que não são opostas àquelas dos indivíduos, mas que são apresentadas de forma extremada chegando a expor situações absurdas, faz com que tais indivíduos revisitem suas opiniões. O ato de revisitar as próprias ideias os sensibilizam, o que por sua vez leva a outros desdobramentos.
Achados impressionantes, pensa Irene. Isso quer dizer que a melhor estratégia para se sensibilizar um radical não é contra-argumentar e nem discutir. A melhor estratégia é se posicionar da mesma forma que o radical, mas de forma exagerada e veladamente absurda. É o teatro do absurdo a serviço da paz na Terra...sempre romântica essa Irene...
Reprodução : O Globo

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