O Judaismo Humanista é a pratica da liberdade e dignidade humana
A manipulação de massas e a propaganda na Alemanha do Terceiro Reich (1933-1945) alimentaram uma ideologia de superioridade racial concebida a partir de teorias SURGIDAS no decorrer do século 19.
Adolf Hitler e seus carrascos não demonstraram nenhuma originalidade; pelo contrário, suas idéias intolerantes encontraram inspiração em textos de germanófilos como Arthur Joseph de Gobineau e Houston Stewart Chamberlain.
O auge do nazismo
O rápido fortalecimento do Terceiro Reich e sua postura hostil diante da “questão judaica” na Europa despertaram, sem sombra de dúvida, uma das mais acaloradas polêmicas do século 20. Vários são os fatores que devem ser considerados ao se estudar um dos regimes mais sanguinários da história, responsável direto pela morte de mais de 50 milhões de seres humanos – soldados, civis e prisioneiros de guerra, boa parte deles confinada em campos de concentração e extermínio. Mas, o agravante desse trágico episódio é o advento de uma verdadeira “máquina mortífera” que se instalou no coração da Europa e contou com a ajuda incondicional das nações mais cultas e respeitadas do Velho Continente.
Analisando o contexto histórico, estudaremos a construção do nazismo a partir do apoio popular, uma força representada por 32% dos votantes, um eleitorado decidido a modificar a difícil situação da Alemanha nos anos 1920 e 1930, alvo da humilhação imposta pelo Tratado de Versalhes.
Atualmente, não é possível explicar o nazismo sem entender a carismática figura do Führer Adolf Hitler. A excelente capacidade de oratória do medíocre pintor fracassado levou boa parte da sociedade alemã a um estado de completa hipnose. Ele próprio foi o protagonista da propaganda do regime e seus fervorosos discursos foram responsáveis por levar o nazismo a seu auge. Sua perversa genialidade consistiu em saber adaptar o discurso às mudanças dos tempos.
O nazismo teve sucesso graças a uma propaganda que se aproveitou do descontentamento social pós 1ª Guerra Mundial. O regime social-democrático da República de Weimar ficou associado à humilhação nacional e, por isso, um sentimento antidemocrático se instaurou com extrema facilidade no espectro político da Alemanha. Frágeis coalizões de governo e fortes mudanças no âmbito internacional, como a galopante inflação mundial, a importação de novas ideologias estrangeiras (o comunismo russo, por exemplo) e, principalmente, a depressão econômica de 1929 foram responsáveis diretos pela maior crise financeira, política e social do país.
Uma nova disciplina científica
É de consenso comum atribuir os primórdios do nazismo à derrota sofrida pela Alemanha na 1a Guerra. Esta grande guerra pressupõe a aplicação sistemática do poder dos meios de comunicação de massa, especialmente a imprensa, à propaganda política, através de panfletos, cartazes e outros meios visuais e auditivos, como o cinema e o rádio. Dentre as inúmeras conseqüências da guerra possui um especial interesse a aparição de uma nova disciplina: a teoria da comunicação de massa.
Mesmo que os estudos dos meios de comunicação e da propaganda política sejam antigos, a 1a Guerra Mundial nos traz uma verdadeira evolução no que tange às disciplinas modernas, como a sociologia, a psicologia e a comunicação de massas.
Os estragos causados pela opinião pública – sustentada através da implementação de uma propaganda dinâmica e tendenciosa – criou uma Alemanha povoada por indivíduos carentes de raciocínio, todos eles sujeitos à fácil manipulação.
O êxito sucessivo dos totalitarismos e, certamente, do nazismo, foi um propagador dos meios de massa para poder garantir apoio popular ao regime. Vemos também aqui a construção de um modelo unidirecional de comunicação,
no qual o poder político fica em mãos dos próprios meios e das elites que se escondem por trás dos mesmos.
Na Alemanha do Terceiro Reich existiu toda uma conexão entre as mensagens direcionadas e os comportamentos manifestados pelo público: se uma pessoa é atingida pela propaganda ela poderá ser controlada, manipulada e induzida a atuar. É justamente através da procura do “homem providencial” que Hitler se converteria na “raison d´être” de uma boa parte da população, atolada de problemas econômicos, ferida e humilhada após sua derrota. Dessa forma, o terreno continuaria fértil para apoiar qualquer manipulador de propaganda. Hitler garantiu uma eficiente propaganda cujo objetivo final era garantir a mobilização.
Influenciado por tratados de psicologia de massas e por sua experiência como agitador de cervejarias, Hitler edificaria um partido nazista e consolidaria um Estado alemão inseparáveis; ambos baseados no culto ao líder, resumido brilhantemente no ditado nacional: “Ein folk, ein Reich, ein Führer” (um povo, um regime, um dirigente).
A prioridade da propaganda
Todas as estratégias de propaganda latentes no partido nazista estão presentes desde o início. A partir do período que abarca os anos 1933-1939, desde a chegada de Hitler ao poder até a invasão e conquista da Polônia (início da 2ª Guerra Mundial), a utilização da propaganda ficou cada vez mais sofisticada, atingindo parcelas cada vez maiores da população. Com o passar do tempo, o Estado nazista vai-se configurando, cada vez mais, como estado autoritário, no qual a função da propaganda será essencial para sua manutenção no poder. Os nazistas centralizam os meios de comunicação e os colocam a seu serviço, estabelecendo, assim, um rígido controle e uma forte censura sobre os conteúdos a serem transmitidos.
O Ministério mais importante durante o nazismo, àquele ao qual se direcionam mais recursos, não será – como seria de se supor – o Ministério de Guerra, mas, sim, o Ministério da Propaganda, dirigido brilhantemente pelo temível Joseph Goebbels. Precisamente a partir desse Ministério, Goebbels fará o culto à personalidade de Hitler e à cúpula de seu governo.
A propaganda fez com que os delirantes objetivos de um pequeno grupo se convertessem em objetivos compartilhados por toda uma nação, a mais culta e respeitada da Europa.
A importância dos símbolos
A ideologia nazista está sustentada em fontes que geralmente remetem a um passado distante, como é o caso da suástica. O regime nazista é um regime milenar, dominado por uma filosofia ocultista e esotérica, toda ela elaborada por premissas míticas.
As forças do bem combatem as forças do mal. Naturalmente, tudo virará uma questão de ótica: o que representa o bem para a Alemanha não necessariamente representa o bem para o resto das nações da Europa. Como já registrou Adrian Huici em sua obra Estratégias da persuasão: mito e propaganda política, o Terceiro Reich incluirá o milenarismo com o mito das três idades, combinando as antigas mitologias germânicas com reflexões do herói carismático, e discutindo a necessidade permanente de uma violência redentora.
Por outra parte, a simbologia nazista apelou de forma agressiva a um imaginário nascido do romantismo de Goethe, Nietzsche e Wagner. Ela revitalizou a idéia dos tempos antigos e sagrados, recriou o volkgeist (espírito do povo germânico) e reinventou o mito da superioridade ariana.
As passeatas e manifestações públicas realizadas em grandes cidades como Berlim, e os efusivos discursos de Hitler aparecem investidos numa simbologia criada para impressionar as massas, destinada a colocar uma espécie de liturgia mística em toda e qualquer propaganda política. A capacidade de oratória de Adolf Hitler com essa parafernália mítica que o acompanhava em seus discursos gerou no público que o escutava um estado de êxtase jamais visto anteriormente.
A deificação do líder
Todos os regimes totalitários, sejam eles fascistas ou nazistas, sustentam-se no culto a uma única pessoa, um líder redentor, que atende a todas as paixões das massas e concretiza todos os objetivos do regime que representa. Os sistemas políticos não-democráticos (por momentos, também os democráticos acabam sempre cultuando alguma personalidade, algo que, certas vezes (como no exemplo do stalinismo), apresenta-se como uma degeneração dos postulados ideológicos originais. O fascismo está na própria raiz do sistema político. Seu líder deverá ser um ser carismático, dotado de virtudes e, conseqüentemente, detentor de uma infalibilidade quase papal.
A fidelidade cega ao Führer, resumida na saudação Heil Hitler (Viva Hitler), era exigida não só entre os membros do Partido Nacional Socialista, mas também na totalidade dos alemães, uma vez que o Estado e o partido estavam fundidos numa mesma entidade. Desta forma, todos os recursos do Ministério da Propaganda destinavam-se à criação de mais um mito, o do Führer, um caudilho que, primeiramente, tiraria os alemães de uma situação humilhante, para instaurar, pouco depois, um Reich eterno, baseado na supremacia racial.
A indiscutível liderança de Hitler, obtida após o expurgo da noite de 30 de junho de 1934, “Noite das Facas Longas”, quando líderes das SA foram detidos e executados por esquadrões de execucão das SS, foi elevada por Joseph Goebbels e os meios de comunicação a uma categoria divina.
Não obstante, os estudos realizados sobre a figura de Adolf Hitler mantêm o consenso em relação a uma característica: a mediocridade do personagem. Este fato, que, a princípio causa perplexidade, fica ainda mais claro ao se saber que o Führer tinha duas grandes virtudes: uma convincente oratória e uma obsessão pela propaganda. Aliadas, ambas causariam um forte efeito nas massas.
Evidentemente, nos discursos de Hitler não era importante o seu conteúdo, geralmente banal e reiterativo. Relevante era sua elaborada “encenação” diante das multidões, sedentas por um discurso otimista e promissor. Mesmo não sendo um orador espontâneo, sua retórica e seu mis-en-scène diante dos holofotes eram perfeitos. Suas palavras impecáveis, sempre repletas de simbologias, vinham atreladas a slogans como o famoso Die Juden sind unser üngluk (Os judeus são nosso infortúnio). Ademais, tinham uma euforia ímpar e eram transmitidas com uma exagerada gesticulação.
A leitura dos discursos proferidos por Hitler é ainda insuficiente para captar o efeito causado na sua audiência. Como escreveu Alejandro Pizarroso Quintero: “O Führer utilizava a técnica do crescimento no discurso: começava lentamente, com voz monótona, transmitindo total indiferença por seus ouvintes, uma atitude de apatia. Em determinado ponto, acompanhado de gestos com sua mão direita, o discurso virava um torrente de palavras, sua voz vibrava eufórica, chegando a um final brusco, para logo depois recomeçar sua fala”.
A criação de inimigos
Afirmamos que o principal objetivo do nazismo era instaurar uma nova ordem, o Terceiro Reich, um regime de mil anos concebido a partir da proteção do sangue alemão e a pureza racial. Para atingir este propósito, os nazistas pregaram a necessidade de ampliar o Lebensraum (espaço vital), oferecendo forte combate a duas forças ideológicas opostas a seus objetivos: o marxismo e o sionismo. Parafraseando Kershaw, podemos afirmar que “o darwinismo social e a interpretação racista da história ofereciam uma justificativa, enquanto a política não passava da luta de um povo pela sua existência. Neste princípio de ferro, o mais débil cairá para que o mais forte ganhe vida”. Em outras palavras e seguindo este pensamento darwinista, há três valores que determinam o destino do povo alemão: o valor da raça ou do sangue, o valor da personalidade e o sentido de luta ou impulso pela sobrevivência. Estes valores presentes na raça ariana estavam ameaçados por três "vícios": a democracia, o pacifismo pós-guerra e o internacionalismo incorporado ao marxismo judaico.
Os nazistas aproveitaram a grande depressão econômica de 1929 e a hiperinflação de princípios da década de 1920 para despejar a verborragia contra a República de Weimar. A doutrina do Lebensraum e a eminente necessidade de uma luta militar e mitológica contra o maléfico “sionismo internacional” constituem os pontos nevrálgicos da propaganda nazista, cujo maior objetivo era entusiasmar a população, ocultar os problemas do governo e, acima de tudo, descarregar a raiva e as frustrações dos alemães sobre um bode expiatório: o judeu, o verdadeiro culpado de todos os males da sociedade germânica.
A sociedade alemã está estruturada como um organismo vivo. Todos pertencem à raça ariana e serão felizes por fazer parte dessa sociedade. A rigor, quase todos. A propaganda nazista brinca com o medo do cidadão de não fazer parte e se isolar das massas. Todos querem integrar o projeto. Ele fascina por ser gigantesco.
A proposta hitlerista sugere uma rápida manipulação para obter uma eficácia propagandística na circulação da mensagem. O Estado é quem controla a sociedade e o cidadão. E, sendo assim, dentro desse corpo social, o judeu constitui um “corpo estranho”, uma espécie de micro-sociedade alheia ao projeto do Terceiro Reich. O resultado final é claro: retirar toda suspeita e susceptibilidade que porventura existam na sociedade.
Palavras finais
O Terceiro Reich foi um regime nocivo e maquiavélico, que conseguiu obter o apoio incondicional do povo alemão e o uniu através de quatro componentes: a propaganda criada após a 1ª Guerra, a mobilização das massas influenciadas pela ideologia nacional-socialista, o culto à personalidade do Führer Adolf Hitler e, por último, a criação de um inimigo comum – um bode expiatório – encarnado na imagem diabólica dos judeus.
Todos estes componentes funcionaram conjuntamente. Um dependia do outro. Cada um deles, em separado, não conseguiria jamais mobilizar o conjunto da sociedade mais civilizada da Europa.
Hitler não ergueu esse sistema sozinho, que funcionou graças a uma engrenagem perfeitamente pensada. Não bastou criar; foi preciso, também, participar. Não há dúvida alguma que a população alemã foi manipulada, como também foi manipulada a liderança mundial dos anos de 1930 e 1940.
A construção do nazismo não foi obra de um ser extraterrestre.
Foi obra de um homem que contou com a ajuda de diferentes colaboradores. Todos eles possuem uma parcela de culpa na situação de destruição em que foi deixada a Europa em 1945.
Hoje resta apenas refletir sobre fatos, repudiar vergonhosos comportamentos e entender os irreversíveis episódios históricos para que eles não jamais voltem a se repetir. Vivamos intensamente o presente extraindo os tristes ensinamentos do passado. O Prof. Reuven Faingold é historiador e educador. PhD pela Universidade Hebraica de Jerusalém. Coordenador de História Judaica do Colégio Iavne e professor titular da pós-graduação no Departamento de Artes Plásticas da FAAP em São Paulo e Ribeirão Preto. É também sócio fundador da Sociedade Genealógica Judaica do Brasil e membro do Congresso Mundial de Ciências Judaicas de Jerusalém.
Bibliografia:
Goldhagen, Daniel, Hitler´s Willing Executioners; Ordinary Germans and the Holocaust, New York, 1996.
Kershaw, Ian, The Hitler Myth: Image and Reality in the Third Reich, London, 1998.
Mosse, G., The Crisis of German Ideology: Intellectual Origins of the Third Reich, New York, 1971.
Pizarroso Quintero, A., História da Propaganda. Planeta Editora. São Paulo, 1993.
Stern, E., The Politics of Cultural Despair:A Study of the Rise of German Ideology, Berkeley, 1961, esp. páginas 267-298.
Wistrich, R., Hitler e o Holocausto, Editora Objetiva, Rio de Janeiro, 2002.
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A construção do nazismo por Prof. Reuven Faingold
Gostei do artigo, mas dizer que a URSS de Stalin era uma democracia, nem como piada!
"também os democráticos acabam sempre cultuando alguma personalidade, algo que, certas vezes (como no exemplo do stalinismo)"
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