JUDAISMO HUMANISTA

O Judaismo Humanista é a pratica da liberdade e dignidade humana

Criminoso nazista mais procurado das últimas décadas, o austríaco Alois Brunner encontrou proteção e conforto em Damasco, onde colaborou com diversos regimes, em especial da dinastia Al Assad, na organização de sofisticados e brutais serviços de repressão.

Os ditadores sírios ignoravam pedidos de extradição, chegavam até mesmo a negar a presença do carrasco em seu país, apesar das fartas evidências e, até mesmo, das entrevistas concedidas por ele à mídia ocidental. Há diversas versões sobre a suposta morte de Brunner, nascido em 1912, importantes investigadores admitiram em 2009 que eram “diminutas” as chances de ele ainda estar vivo. Após a 2ª Guerra Mundial, muitos criminosos nazistas optaram por buscar refúgio em paragens longínquas da América do Sul, como Argentina, Bolívia, Paraguai ou Brasil. No entanto, alguns preferiram optar pela proteção de regimes árabes, em especial no Egito e na Síria. Já na Guerra da Independência, em 1948, Israel registrou a presença de diversos militares oriundos das tropas hitleristas assessorando o exército sírio.

Um dos casos mais conhecidos foi o de Franz Rademacher, que chegou à Síria posteriormente, em 1952. Escapava, com a ajuda de simpatizantes nazistas, da Justiça alemã. Acabou retornando à então Alemanha Ocidental em 1966, onde foi condenado a cinco anos de prisão, mas não cumpriu a pena. Em 1971, novo julgamento, mas Rademacher morreu dois anos depois, antes do fim do processo judicial.

Enquanto na Síria, Rademacher trabalhou no serviço secreto local. Sobreviveu a uma carta-bomba, entregue em 1962 pelo agente israelense Eli Cohen. Responsável pelo extermínio de judeus da Holanda, Bélgica e Sérvia, entre outros locais, Franz Rademacher trabalhou com Adolf Eichmann, arquiteto e implementador da máquina de extermínio de judeus na 2ª. Guerra Mundial. Outro importante assessor do criminoso nazista capturado na Argentina e enforcado em Israel era Alois Brunner.

Eichmann descrevia Brunner como seu “melhor homem”. O assistente havia ingressado no Partido Nazista em 1931. Sete anos depois, a dupla assassina passou a trabalhar em conjunto, em Viena, onde Brunner começou a deportar judeus austríacos. Nascido na Áustria, ele chegou ao posto de capitão da SS, comandou o campo de Drancy, nos arredores de Paris, entre junho de 1943 e agosto de 1944.

Foi responsável pelo envio de cerca de 140 mil judeus a câmaras de gás.Em entrevista a uma revista alemã, em 1985, Brunner alegou ter escapado graças à confusão feita com um criminoso nazista que tinha o mesmo sobrenome, e que foi executado. O carrasco de Drancy sustentou que não tinha tatuagem da SS, o que também teria dificultado sua identificação por autoridades aliadas.

Um passaporte falso da Cruz Vermelha teria permitido a Brunner abandonar a Alemanha em 1954, ruma à Itália e, depois, ao Egito. Desembarcou na Síria para assessorar a máquina de repressão em Damasco e adotou o pseudônimo de Georg Fischer, tentando se passar por médico.

A França o condenou, à revelia, à morte, em 1954, por crimes contra a humanidade. Alemanha e Áustria também apresentaram a Damasco pedidos de extradição. No final dos anos 1950, o caçador de nazistas Simon Wiesenthal localizou o criminoso na capital síria, vivendo sob um nome falso.

A caçada se intensificou, assim como os esforços do governo sírio para proteger um convidado que assessorava na elaboração de técnicas de tortura e de interrogatório. Brunner perdeu um olho e os dedos de sua mão esquerda em cartas-bomba recebidas em 1961 e 1980.

Em 1985, ele concedeu entrevista à revista alemã Bunte. Permitiu ser fotografado. E fez questão de não demonstrar arrependimento e de disparar novas ondas de ódio. Disse, ainda, que jamais teria o mesmo destino de Adolf Eichmann, mostrando em seguida ao repórter uma pílula de veneno que carregava em seu bolso. Dois anos depois, o criminoso conversou por telefone com o Chicago Sun-Times e destilou mais ódio contra o Povo Judeu.

O casal Serge e Beate Klarsfeld, que dedicaram suas vidas à busca de nazistas, tentaram várias vezes agir em Damasco para conseguir a prisão e extradição de Alois Brunner. Em 1990, Serge conseguiu entrar na capital síria, para logo ser expulso pelo governo. Sua mulher entrou anos depois, com um passaporte falso, para ser detida e deportada.

Houve também pressão diplomática pela extradição do criminoso. Há relatos de que o regime de Hafez Al Assad teria concordado, no final do ano 1989, em entregar Brunner ao moribundo regime da então Alemanha Oriental. O ditador sírio e os comunistas alemães tentariam, assim, em meio à desintegração do mundo soviético, um golpe para melhorar sua imagem perante os países ocidentais. Mas a queda inesperada do muro de Berlim, em novembro de 1989, teria abortado o plano.

Em Damasco, Brunner contava com a proteção estatal e uma vida confortável. Em um período, morou na Rua Haddad, 7, num dos bairros mais sofisticados da capital síria. Contava com proteção policial 24 horas por dia, na entrada do prédio e no 3º. andar, onde ficava seu apartamento. Costumava passear no parque Zanoubia todas as manhãs.

A Embaixada francesa em Damasco, segundo o jornalista Georges Malbrunot, tinha informações na década de 1990 que o criminoso de guerra nazista costumava se encontrar com alemães-orientais para tomar chá. Malbrunot escreveu, também, que uma amiga lhe relatou ter vivido num imóvel em frente ao de Brunner, no centro de Damasco.

Nos anos 1990 circulam os rumores sobre a suposta morte do protegido do regime Assad. Uma versão sustenta que Brunner morreu em 1996 e foi enterrado pelo serviço secreto sírio no cemitério de Dar Dah. Jornalistas alemães, no entanto, afirmam ter identificado o ex-capitão da SS no hotel Meridian, em Damasco, em 2001.

Dois anos depois, o diário britânico The Guardian classificou Brunner como o “fugitivo nazista de mais alto escalão que se acredita ainda vivo”. O tema ressurgiu no ano passado, quando o semanário alemão Der Spiegel publicou que o serviço secreto alemão destruiu, entre 1994 e 1997, um dossiê sobre Brunner com mais de 500 páginas.

Há quem acredite que um futuro regime sírio poderá finalmente revelar detalhes sobre a vida de Alois Brunner no país. Tal gesto vai depender de quanto os eventuais novos mandatários de Damasco quererão melhorar suas relações com os países ocidentais.

O Jornalista Jaime Spitzcovsky foi editor internacional e correspondente da Folha de S. Paulo em Moscou e em Pequim

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