JUDAISMO HUMANISTA

O Judaismo Humanista é a pratica da liberdade e dignidade humana

ZEZÃO - Firmino, mermão, me deixe entrar, por favor!

FIRMINO - Mas é claro, meu prezado, é seu esse meu chatô!

ZEZÃO - Dê licença, gente boa, que o destino, meu nobre e justo Firmino, fez de mim gato e sapato, você nem queira saber!

FIRMINO - Na alegria e na tristeza, cê sabe, sou todo ouvidos, portanto, homem, me diga, o que lhe faz tanto sofrer?

ZEZÃO - Antes mesmo que lhe conte, amigo velho de guerra, me deixe descansar o corpo, apascentar essa alma e na santa calma do abrigo tomar um trago consigo.

FIRMINO - Assim seja feito, meu nobre, mas não demore a dizer, que o que lhe mata por dentro é fora que vai lhe salvar. Agora espere um momento, que aquela porta entreaberta é um perigo na certa, tem sempre quem queira espiar.

FIRMINO VAI ATÉ O FUNDO DA SALA E FECHA A PORTA DO QUARTO. VOLTA COM UMA GARRAFA DE CACHAÇA E DOIS COPOS.

ZEZÃO - Ela chegou sorridente, Firmino...

FIRMINO - Ela quem, homem de Deus?

ZEZÃO - Glorinha, Firmino, Glorinha, a mina dos olhos meus! Chegou como quem fosse pousar o corpo mais que perfeito na planície do meu peito, até beijo ela me deu! Mas de repente, colega, uma lufada de vento, ou sei lá que nome tenha, invadiu o ambiente, e ela, a mulher de uma vida, aquela por quem fiz de um tudo, se transformou em serpente, se chegou por trás de mim, me enlaçou pelo cangote e gritou no meu ouvido: "seu merda, seu papa tudo, pensa que eu não lhe vi de olho naquela zinha?!". E nem me refiz do susto, me deu uma bofetada, me disse poucas e boas, jogou no vaso a aliança e saiu dizendo "obrigada!".

FIRMINO - Obrigada, Zezão? Foi isso que ela lhe disse?

ZEZÃO - Pois é, amigo Firmino, quem é que pode entender a mufa esquentada das mulha? Já eu tô fora, meu chapa, de quebra cabeça cansei. Vai ver que me agradeceu por não ser dado a macheza, não ter posto o pau na mesa, não ter feito ver a ela quem no pedaço era o rei.

FIRMINO - Vai ver, prezado, vai ver...

OS DOIS FICAM EM SILÊNCIO. FIRMINO, APREENSIVO, OLHA PARA A PORTA FECHADA DO QUARTO, DE ONDE SE OUVE BAIXINHO, UM SAMBA DE CIRO MONTEIRO. O SAMBA VAI NUM CRESCENDO, ATÉ QUE A PORTA SE ABRE E SURGE, BELA E TRIUNFANTE, GLORINHA. ZEZÃO LEVA UM SUSTO. FIRMINO ESTÁ COMPLETAMENTE SEM GRAÇA.

ZEZÃO - Glorinha, meu Deus do céu, o que é que cê faz aqui?!

GLORINHA - E não é o que eu pergunto, seu cretino, vagabundo? E largue de olhar pra mim, que não sou alma de outro mundo! Agradeci, sim, pelo pouco que me deste, pelo amor desengonçado e o papelão que fizeste, seu traste, biltre, boiola! E ainda mais que me apresentaste a um homem de verdade, que esse, sim, tá sempre na minha cola, me dá vestido, dá jóia, dá perfume, dá vitrola, era o marido perfeito se eu quisesse ter pra mim!

FIRMINO - Se quisesse, Glorinha??!!

GLORINHA - É, Firmino, é assim. Não quero mais nada de ti, que a lição já foi bem dada. E não há nenhum mistério em lhe dizer obrigada. Foste gentil, boa praça, educado e paciente, mas o que se vai fazer se a paixão é essa peste que fere os ossos da gente, que faz da razão despautério e do homem sério um demente?
E agora vamos pra casa, coisa ruim que amo tanto, anjo torto, cafajeste, enxugue o pranto da cara, erga a cabeça e confesse: sou ou não sou a Glorinha, aquela que dá e não desce?!

FIRMINO, DESOLADO, BAIXA A CABEÇA E PERMANECE EM SILÊNCIO. ZEZÃO, ATURDIDO, SAI DE MÃOS DADAS COM GLORINHA. A VITROLA, NO QUARTO, ESBRAVEJA:

                                                  Se acaso você chegasse
                                                  No meu chatô e encontrasse
                                                  Aquela mulher que você gostou
                                                  Será que tinha coragem
                                                  De trocar nossa amizade
                                                  Por ela que já lhe abandonou
                                                  Eu falo porque essa dona
                                                  Já mora no meu barraco
                                                  À beira de um regato
                                                  E de um bosque em flor (...)


                                                                FIM



Exibições: 57

Respostas a este tópico

Ai! Coisa boa de doer, caro Jaime.
Ab.
Elias
Meu querido amigo, continuo tateando neste universo de siglas e ordens para anexar, carregar, parar de acompanhar, compartilhar, e outros que tais. Mas, se esta mensagem chegar até você, creia que fico muito feliz de que tenha lido e sido tocado por este modesto escriba. E se você souber como me adicionar aos seus "amigos" (eu ainda não descobri como se faz, nenhuma criança se dispôs a ensinar o pulo do gato a este espécime surpreendentemente expelido do século XIX), por favor, faça-o.
Um grande e afetuoso abraço,

Jaime.

Elias Salgado disse:
Ai! Coisa boa de doer, caro Jaime.
Ab.
Elias

RSS

© 2024   Criado por Jayme Fucs Bar.   Ativado por

Badges  |  Relatar um incidente  |  Termos de serviço