Quem são os ultraortodoxos?
Avirama Golan / Haaretz
Quanto mais a sociedade israelense se deteriora e os usuários de quipá se dividem e subdividem em grupos e comunidades com distintos estilos de vida e distintas relações com a sociedade e o Estado, mais superficial é a perspectiva com que os seculares os vêem.
Quem, de fato, é haredi, ultraortodoxo?
É aquele sujeito de longos cachos laterais e talit , que põe fogo em latas de lixo, quebra ossos de repórteres e declara orgulhosamente para as câmeras de tevê que “cada filho meu é uma represália contra os sionistas”?São haredim aquelas pessoas de Beit Shemesh que há algumas semanas apedrejaram uma mulher por julgar que ela não estava vestida com recato, e quase a mataram?
Talvez haredi seja aquele homem jovem, pálido e tímido, caminhando por Bnei Brak, expressão desanimada, sem olhar para nada a caminho da ieshivá, onde fica escondido até a noite, absorto nos livros e esquecido de comer e beber. Ou talvez seja aquele corpulento hassid que anda pelo Boulevard Rothschild, em Tel Aviv, empurrando um carrinho abarrotado com um bebê e outras duas crianças que mal começaram a andar, seguido de perto de mais algumas crianças. Também à mão estão a sua filha adolescente, vestida com uma saia azul longa, e, a uma certa distância, a esposa, mãe de seus filhos.
Ou, quem sabe, haredim são os estudantes da Faculdade de Kiriat Ono, futuros advogados e contadores, ou, talvez, a jovem que será a tesoureira da prefeitura de Bnei Brak, ou estudantes de MA da Universidade Harvard, ou os proprietários e funcionários de um restaurante glat kosher em Hertzlia Pitúah. Talvez sejam os habadniks que, em seus esforços para praticar mitsvot, acendem velas de Shabat no coração de Tel Aviv. Mas eles não pertencem também ao grupo que tenta assumir Ramat Aviv?
Ai de nós! Há um racha interno até entre eles ‒ os messiânicos e os não messiânicos, os novos observantes e os veteranos, e por aí vai. Com todas estas diferenças, fica impossível definir a palavra “haredi”, assim como é impossível definir “judeu” ou “árabe” levando-se em conta todas as variantes humanas, religiosas, culturais e sociais dessas definições.
Não há conexão entre o novo religioso que canta “Na-Nah-Nahman” dançando na rua e os universitários. Certamente não há ligação entre a futura tesoureira da prefeitura de Bnei Brak e a “mamãe talibã” ou entre uma criança hassídica cujos pai e avô são reservistas e trabalham para ganhar a vida e um jovem que “fortalece a sua fé” vivendo de donativos.
Tampouco há conexão entre os que promovem badernas no Shabat e as famílias hassídicas veteranas de Netânia e Haifa, que trabalham e pagam impostos. E não há conexão entre essas famílias e, por exemplo, Shlomó Benizri, do Shas, ou seu rabino, que incita as pessoas a se tornarem religiosas. Há também uma variedade muito grande entre as centenas de milhares de eleitores do Shas.
Este grande grupo de pessoas, a maioria das quais profundamente comprometida com a sociedade israelense, é representado na política e na mídia por indivíduos que não são eleitos, mas nomeados, e cujos interesses não refletem as necessidades da sua comunidade; às vezes, até se opõem a elas. Além disto, três outros fatores muito prejudiciais operam nessa comunidade: os antissionistas de Jerusalém, os pregadores fanáticos associados aos que incitam as pessoas a se tornarem religiosas e os nacionalistas ultraortodoxos extremistas (por exemplo, o rabino Itzhak Guinsburg e seu filho, que age em Ramat Aviv).
Estes quatro fatores se defrontam com as apreensões da baixa classe média ‒ a secular, a tradicional e a nacional-religiosa. Preocupada com a possibilidade de perder a pequena segurança sócio-econômica que tem, essa gente batalha para garantir o emprego, pagar o seguro saúde e um teto para morar, cuidar de seus idosos e educar suas crianças. Em sua aflição, ela busca culpados. E encontra dois alvos fáceis: “os árabes”, que, por cortesia do Israel Beiteinu, vêm sendo tachados de “desleais ao Estado”, e “os haredim”, que, desde o advento do partido Shinui, têm sido classificados coletivamente como “parasitas”.
Essas pessoas que têm medo de perder o que possuem deveriam lembrar-se de uma coisinha: as preocupações econômicas estão empurrando muitos religiosos moderados para os braços dos haredim, da mesma forma que as preocupações econômicas, sociais, culturais e nacionais empurram a comunidade árabe moderada para os braços do movimento islâmico.
E os maus presságios apontam não para “os árabes” ou “os haredim”, mas para o governo, que abandonou os seus cidadãos e os entregou aos extremistas.
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