JUDAISMO HUMANISTA

O Judaismo Humanista é a pratica da liberdade e dignidade humana

                                       Paz Primeiro. Política depois.

      

Em setembro de 2009 realizou-se no Rio de Janeiro uma mostra intitulada “Cinema Alem Muros”. Nela, reuniram-se, talvez pela primeira vez no mundo, os cinemas de Amos Gitai e Abas Kiarostami, um israelense e um iraniano que nunca conversaram ao vivo. Participei como membro da mesa que abriu o ciclo. Na época, fiquei encantado com o titulo da mostra que deu ao cinema a força de um tapete voador capaz de transpor muros e separar diferenças que, normalmente, não conseguem se olhar olho no olho. No entanto, não pude deixar de lembrar que também existe o cinema-muro, como o filme “Nossa Música” onde Goddard se fez porta voz de uma “verdade” pret a porté, e como toda verdade que se preza, aquela também estava fechada para outras possibilidades.

Qualquer discurso que coloque os seus objetivos de ter razão em primeiro plano utilizando a imagem ou a palavra como meio de justificar os seus pressupostos, acaba no mesmo lugar. Naquele evento também lembrei o cinema instrumentalizado como o de Lennie Rifenstal. Ali, a cineasta oficial do nazismo, colocou o seu talento a serviço de um projeto hitlerista onde o humano ligado através do sangue se transformava numa partícula de um todo sem qualquer possibilidade de exercer a liberdade de escolha ou decisão. Este tipo de construção ideológica também presente no pensamento religioso institucionalizado, desqualifica de antemão a escolha individual em nome de um todo que não admite que alguém fique de fora. E quem insistir em ficar será chamado de traidor como tem acontecido com os militantes da paz em Israel.

 Tráta-se de um padrão de pensamento que sempre retorna como se fosse a essência da política transformar em pó o frágil muro da racionalidade que ainda pode proteger a humanidade de seus ímpetos destrutivos. Só uma decisão racional é capaz de inventar e investir numa idéia tão estranha como o respeito ao diferente para viver sem guerras.

Enquanto eu preparava a participação na mostra de cinema matava-se nas ruas do Irã em nome de Alá. No dia anterior, um médico acudiu uma jovem baleada que acabou morta e ele, ameaçado, fugiu do país. Fugiu por tentar salvar uma vida! Acuada pelo exército durante o dia, de noite parte da população de Teerã subiu aos telhados proclamando a grandeza de Alá como se fossem seres do deserto uivando em direção ao céu que, no entanto, permaneceu neutro. Mais uma vez foram as forças aqui em baixo quem decidiram do lado de quem os deuses iriam ficar. Enquanto isto no nosso Brasil forças ditas de esquerda assistiam em silêncio o martírio de um povo submetido a uma ditadura religiosa.

O filme onde o diferente é acusado de traidor não cansa de ser repetido, só mudam os personagens. Aqui no Brasil quando alguém denuncia o aparelhamento do estado brasileiro pelas mãos de um PT, ele é atacado ao invés de buscarem provas para desmentir a noticia. Desta maneira voltamos ao velho filme onde a política partidária é sempre o mesmo ato de servir-se do estado para os seus próprios interesses. Escrevo estas linhas me lembrando quando em minha insistente busca de acreditar publiquei na primeira posse de Lula um artigo intitulado “O Messias Iluminista” no Jornal do Brasil. Já no título dava para ver que o artigo era uma crítica aos que acusavam Lula de posar de líder messiânico. Enquanto o iluminismo aposta na razão para aproximar os homens o messianismo espera que a solução venha de fora e se imponha como milagre. E eu, é claro, acreditei que Lula fazia parte do Iluminismo Futebol Clube.

 Desejo de desejo de paz é diferente de desejo de fazer política do desconhecimento do outro. Lembram do Anuar Sadat presidente do Egito? Aquele que foi morto pela sua guarda pessoal, ligada aos irmãos muçulmanos, berço Do Hamas. Anuar Sadat pegou um avião no Cairo, foi fazer um discurso no parlamento em Jerusalém e pagou com a própria vida a audácia do gesto. Ele um direitista, assombro dos assombros, e Menachem Béguin, um herdeiro do terrorismo do grupo Stern e de Zeev Jabotinsky, um admirador de Mussolini, atuaram juntos num filme além muros sem qualquer pudor e em total descompromisso com as suas biografias. Só depois de um discurso duro pronunciado no parlamento israelense por Anuar Sadat, entrou a política e suas negociações. As terras Egípcias foram desocupadas. A troca até então impensável de embaixadas se realizou e se mantém, com todas as dificuldades, ate os dias de hoje.

Reconhecimento do outro primeiro. Política depois. Eis ai um ensinamento do filósofo judeu Emanuel Lévinas que sempre me faz pensar o quanto ele não interessa à política ilusionista dos donos do poder. Nos últimos dias me defrontei novamente com esta questão. A primeira vez foi quando o presidente Álvaro Uribe da Colômbia afirmou que o presidente Lula reduz o conflito com a Venezuela a uma questão pessoal tirando o foco da verdade comprovada de existência de acampamentos das FARC no país vizinho. A segunda quando recebi hoje uma cópia de um documento da presidência da republica doando ao Hamas (ali falam da Autoridade Palestina) a quantia de vinte e cinco milhões de reais( enquanto isto o hospital da UFRJ invadido por infiltrações esta sem possibilidades de fazer cirurgias por que  UTI foi interditada e parte do prédio ruiu).

É claro que Lula sabe que problema político não é pessoal, mas a sua estratégia de emocionalizar os debates para desviar a atenção, também foi usada na crise do Iran quando o assassinato de dissidentes ficou camuflado ao ser comparado a um jogo de futebol. A linguagem light oculta os interesses da política petista que escolhe a quem vai ajudar desde que pareça que assim está exportando uma política revolucionária. Desta maneira ao invés de usar de outra verdade inventada, de que o Brasil é um país sem conflitos étnicos e por isto pode ajudar a todos, o que faz é derrubar o próprio mito que tenta vender ao mundo.

Mais uma vez constatamos que a política usa a linguagem para manipular e seduzir buscando o que sempre busca: poder e hegemonia. O outro nunca interessa ao sedutor. Ele não passa de um chato que perturba se pensar diferente e interessa muito pouco aos planos hegemônicos das potências reais ou daquelas que, ainda emergentes, querem tomar os seus lugares.

Paz primeiro. Política depois.

        


        

           

           

               

 

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Respostas a este tópico

Paulo!

Que bom poder estar no quintal deste sítio! Um sítio sem fronteiras ou cercas.
Pena que o ning tornou esta rede uma propriedade privada. Mas compartilho das palavras do Jayme!

:)

Flávia
QUANDO O RACIONAL FICA REALMENTE AO LADO DA RAZÃO: coerência e poesia na escrita de Paulo Blank sobre poder e “verdades” – por Elias Salgado




“Só uma decisão racional é capaz de inventar e investir numa idéia tão estranha como o respeito ao diferente para viver sem guerras.” Paulo Blank



Caro Paulo, pelo vício do ofício, recorrerei à velha e útil História para ir ao teu encontro, quando falas do poder e seu uso/abuso do aparato de Estado.
Indo à fonte tanáchica e lembrando o reticente profeta Samuel, que tentou o quanto pode, evitar a tomada do poder pela monarquia dos homens, já profetizava( ante via, mais por uma questão de lógica do que qualquer outra coisa) em seus argumentos contrários à vontade popular por um Rei, registrados no texto “MISHPAT HAMELECH” ( O Julgamento do Rei – tradução literaL)( SamueII), todas as atrocidades humanas que poderiam acontecer, quando o poder subisse à cabeça dos monarcas. Destaco como a mais básica e importante alegação do profeta, seu temor( certeza) de que o poder real é parcial/injusto em seus atos, decisões e julgamentos. E infelizmente o profeta estava certo e a velha História só entra aqui para corroborar, pois deu no que deu...
Fiquemos apenas com as consequências históricas , sem pensar/aceitar a visão do castigo divino: abuso de poder, decadência espiritual e moral, e por fim a divisão do Reino, o desaparecimento das 10 tribos de Israel, a destruição do 1º
Templo e o Exílio na Babilônia.
Este é apenas o/um exemplo histórico dos judeus. Cada nação e o seu...E lembro agora de um dito/música israelense que explica bem uma das bases teóricas da História:
“Rabotai haHistoria Chozeret....” ( Senhores a História retorna( se repete”...)
Diriam alguns, que o que apregoamos ao temer tanto o poder constituído e sua posse do Estado, soa muito familiar... “Estariam estes loucos falando, escrevendo e pensando como velhos anarquistas”? Se verdade for, nada mal, não acha? Até onde sei o Anarquismo é entendido como tão utópico, principalmente por sua pretensão de inexistência de um governo central ((anti)política?) e uma total supremacia da vontade popular individual ( uma visão utópica de vida harmônica(paz?) entre os diferentes., sem a necessidade de controle de alguns ( política)
E eu pergunto, querido amigo e mestre: utopias soam/são irracionais? Oxalá que assim se pense, pois eu me sentiria tão feliz e prenhe de uma certa “razão”, e principalmente, poderia gozar, por momentos que fosse, de aceitação por minha irracionalidade( loucura) – qualidade minha que tanto prezo...
Caro Elias quanta coisa vc levantou em teu questionamento.Mas vou me restringir na resposta: quem melhor do q vc para saber que utopias não são irracionais e nem mesmo a loucura.Lembra do Hamlet q se fazia de louco? Um personagem comenta"Ele está louco,mas há método em sua loucura" Método é racionalidade. temos sempre um método em nossas loucuras.Há que buscá-lo.
No meu artigo eu me refiro aos nossos sentimentosde dominação e de poder presentes no bicho homem desde o nascimento e que só uma decisão racional e totalmente utópica da cultura faz com que a gente segure esta tendência e construa uma idéia de diálogo com o outro.É um pensamento totalmente judáico e calcado em nossa tradição. O Rambam ensinou que todas as professias eram verdadeiras.Não pq se realizaram mas pq mereciam ser realizadas.Eis aí uma formulação que resolveu para mim em definitivo o problema da utopia como merecimento e não necessariamente como coisa realizada.Grande abraço.

Elias Salgado disse:
QUANDO O RACIONAL FICA REALMENTE AO LADO DA RAZÃO: coerência e poesia na escrita de Paulo Blank sobre poder e “verdades” – por Elias Salgado




“Só uma decisão racional é capaz de inventar e investir numa idéia tão estranha como o respeito ao diferente para viver sem guerras.” Paulo Blank



Caro Paulo, pelo vício do ofício, recorrerei à velha e útil História para ir ao teu encontro, quando falas do poder e seu uso/abuso do aparato de Estado.
Indo à fonte tanáchica e lembrando o reticente profeta Samuel, que tentou o quanto pode, evitar a tomada do poder pela monarquia dos homens, já profetizava( ante via, mais por uma questão de lógica do que qualquer outra coisa) em seus argumentos contrários à vontade popular por um Rei, registrados no texto “MISHPAT HAMELECH” ( O Julgamento do Rei – tradução literaL)( SamueII), todas as atrocidades humanas que poderiam acontecer, quando o poder subisse à cabeça dos monarcas. Destaco como a mais básica e importante alegação do profeta, seu temor( certeza) de que o poder real é parcial/injusto em seus atos, decisões e julgamentos. E infelizmente o profeta estava certo e a velha História só entra aqui para corroborar, pois deu no que deu...
Fiquemos apenas com as consequências históricas , sem pensar/aceitar a visão do castigo divino: abuso de poder, decadência espiritual e moral, e por fim a divisão do Reino, o desaparecimento das 10 tribos de Israel, a destruição do 1º
Templo e o Exílio na Babilônia.
Este é apenas o/um exemplo histórico dos judeus. Cada nação e o seu...E lembro agora de um dito/música israelense que explica bem uma das bases teóricas da História:
“Rabotai haHistoria Chozeret....” ( Senhores a História retorna( se repete”...)
Diriam alguns, que o que apregoamos ao temer tanto o poder constituído e sua posse do Estado, soa muito familiar... “Estariam estes loucos falando, escrevendo e pensando como velhos anarquistas”? Se verdade for, nada mal, não acha? Até onde sei o Anarquismo é entendido como tão utópico, principalmente por sua pretensão de inexistência de um governo central ((anti)política?) e uma total supremacia da vontade popular individual ( uma visão utópica de vida harmônica(paz?) entre os diferentes., sem a necessidade de controle de alguns ( política)
E eu pergunto, querido amigo e mestre: utopias soam/são irracionais? Oxalá que assim se pense, pois eu me sentiria tão feliz e prenhe de uma certa “razão”, e principalmente, poderia gozar, por momentos que fosse, de aceitação por minha irracionalidade( loucura) – qualidade minha que tanto prezo...
Bravissimo!!!
Mazal tov, prezado Paulo!
Que o Eterno, B`H, conceda da Sua sabedoria, inteligencia e discernimento para continuar expondo os fatos com lucidez porem com a poesia que permeia as entrelinhas...
Posso compartilhar? Posso publicar no facebook? O texto esta tão claro e o momento exige luz para as pessoas poderem clarear os pensamentos para fazerem suas escolhas... Há tanto lixo publicado...Tantas verdades ditas grosseiramente...
Shabat shalom...
Oi Angela,claro que pode,mas pode colocar um P.S.: ao negar a libertação da mulher condenada à morte por apedrejamento,o governo do Irã declarou que Lula é um homem emotivo e por isto não entende do que se passa naquelas terras. Pelo visto,não em qualquer lugar do planeta que a estratégia de emocionar para não pensar cola como aqui em nosso pais.

Shavua Tov

Angela R. C. Nespoli disse:
Bravissimo!!!
Mazal tov, prezado Paulo!
Que o Eterno, B`H, conceda da Sua sabedoria, inteligencia e discernimento para continuar expondo os fatos com lucidez porem com a poesia que permeia as entrelinhas...
Posso compartilhar? Posso publicar no facebook? O texto esta tão claro e o momento exige luz para as pessoas poderem clarear os pensamentos para fazerem suas escolhas... Há tanto lixo publicado...Tantas verdades ditas grosseiramente...
Shabat shalom...
Muito bom, Paulo. Muito bem formulado. Paz primeiro, política depois. Palavras proféticas. Palavras dignas de um profeta. Não tenho o que comentar - o que eu teria o Elias já disse. Salvo uma coisa: O Islã radical está tentando destruir a razão. Justamente essa razão que você tanto preza. O Islã radical percebeu, pelo jeito, que a abertura do Ocidente à imigração muçulmana (quando as condições de vida na Europa melhoraram, e começaram a importar mão de obra não especializada) levou à ocidentalização de muitos dos imigrantes (isto não é um fato, é uma suspeita minha). Não li 'Lendo Lolita em Teerã', mas suspeito que é disso que se trata: Quem é contaminado pelo vírus da razão não consegue voltar atrás de deixar-se submeter por superstições. Como é que diz o Levinas? O Judaísmo é uma religião para adultos. Portanto, não é para crianças. É para quem já sabe usar a razão. Você faz alguma ideia do que diria hoje o Levinas sobre a ultra-ortodoxia de Israel? Ou ele já disse, antes de morrer?
Desta vez fui à FLIP, ver o Yehoshúa, cujo livro 'Fogo Amigo' traduzi. Há um personagem importante no livro (o pai do soldado que morreu pelo 'fogo amigo') que decide se afastar de Israel, do Judaísmo, de 'todo aquele lamaçal', como ele diz lá pelas tantas. Porque o filho morreu devido ao seu superego judaico, e não vou contar como por motivos óbvios.
Só estou reforçando o que você e Elias dizem sobre o 'lado de cá'. É perigoso, este também. Houve um Begin capaz de mudar de rumo, mas há (agora) muitos querendo voltar atrás e desfazer o que já foi alcançado. Tocar fogo no mundo.
Não sei o que vai acontecer, mas estou cada vez mais preocupado.
Abração.
Davy.
oi david, se tivesse sabido da tua ida à Fliip pedia um autografo duplo,teu e do Yehoshua.Q pena.Abri outro di a na livraria e fiquei todo orgulhoso qdo vi o teu nome e li tres linhas.ótimo,mto boa a tua tradução.Vou ter q me contentar com um só autografo.PB

Davy Bogomoletz disse:
Muito bom, Paulo. Muito bem formulado. Paz primeiro, política depois. Palavras proféticas. Palavras dignas de um profeta. Não tenho o que comentar - o que eu teria o Elias já disse. Salvo uma coisa: O Islã radical está tentando destruir a razão. Justamente essa razão que você tanto preza. O Islã radical percebeu, pelo jeito, que a abertura do Ocidente à imigração muçulmana (quando as condições de vida na Europa melhoraram, e começaram a importar mão de obra não especializada) levou à ocidentalização de muitos dos imigrantes (isto não é um fato, é uma suspeita minha). Não li 'Lendo Lolita em Teerã', mas suspeito que é disso que se trata: Quem é contaminado pelo vírus da razão não consegue voltar atrás de deixar-se submeter por superstições. Como é que diz o Levinas? O Judaísmo é uma religião para adultos. Portanto, não é para crianças. É para quem já sabe usar a razão. Você faz alguma ideia do que diria hoje o Levinas sobre a ultra-ortodoxia de Israel? Ou ele já disse, antes de morrer?
Desta vez fui à FLIP, ver o Yehoshúa, cujo livro 'Fogo Amigo' traduzi. Há um personagem importante no livro (o pai do soldado que morreu pelo 'fogo amigo') que decide se afastar de Israel, do Judaísmo, de 'todo aquele lamaçal', como ele diz lá pelas tantas. Porque o filho morreu devido ao seu superego judaico, e não vou contar como por motivos óbvios.
Só estou reforçando o que você e Elias dizem sobre o 'lado de cá'. É perigoso, este também. Houve um Begin capaz de mudar de rumo, mas há (agora) muitos querendo voltar atrás e desfazer o que já foi alcançado. Tocar fogo no mundo.
Não sei o que vai acontecer, mas estou cada vez mais preocupado.
Abração.
Davy.

Texto fantástico, parabéns.

Obrigado Rafael pela leitura,é bom saber q os textos nao ficam em um limbo sem serem tocados e sem tocar os coraçoes e as mentes.Grande abraço.Paulo

Rafael Augusto disse:

Texto fantástico, parabéns.

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